“Vim trazer fogo à terra, e como eu gostaria que já estivesse alastrado.” (Lc 12, 49)
Enquanto as queimadas na floresta amazônica se tornam um verdadeiro incêndio político e ecológico de dimensões internacionais, a Igreja prepara para o mês de outubro o Sínodo Especial dos Bispos para a Amazônia, em Roma, abrindo caminhos novos, novos rumos para a Igreja missionária e para uma defesa desse precioso pulmão do mundo. Segundo o Papa Francisco, a Amazônia “é um lugar representativo e decisivo para a sobrevivência do planeta. Grande parte do oxigênio que respiramos é proveniente dali. Eis o motivo porque o desmatamento significa matar a humanidade” (La Stampa, 09/08/19). Mas o Sínodo da Amazônia se insere em uma iniciativa mais ampla, que envolve toda a Igreja no mundo inteiro, que o Papa Francisco chamou de Mês Missionário Extraordinário. Todos os anos aqui no Brasil celebramos o mês missionário. Mas este ano é especial porque o mundo inteiro estará celebrando neste mesmo mês os 100 anos da grande iniciativa pastoral do papa Bento XV de incentivar o ardor missionário em toda a Igreja. Em 1919, havia apenas acabado a Primeira Guerra Mundial. A Europa estava destruída, contabilizavam ainda quantos tinham sido mortos, entre cristãos. Havia ainda muitas tensões políticas (20 anos depois haveria outra grande guerra) e a Igreja sentia ser seu dever preparar-se para viver esse tempo difícil, e ajudar o mundo a encontrar um novo rumo. Nada melhor do que voltar ao Evangelho e sair em missão pelo mundo, pensou Bento XV.
Os tempos de hoje são bastante semelhantes àqueles de cem anos atrás. A guerra agora se dá no campo econômico, nos meios de comunicação, no fanatismo religioso, nos conflitos étnicos, na desproporção entre riqueza e miséria. Os números são parecidos com os de uma guerra verdadeira: centenas de milhares de migrantes, degradação da vida urbana, radicalismo político, governos ditatoriais, corrupção descontrolada, desemprego, fome e miséria moral crescente. Nesse contexto, o Papa Francisco convoca a Igreja para um novo empenho missionário. Levar a fé aos que não conhecem, levar vida onde ela é maltratada e aviltada e todos os batizados são chamados a ser esses missionários. É este o fogo de que falava Jesus, o fogo do amor. E ele queria que já estivesse alastrado.
Um novo olhar
O papa Francisco disse logo que assumiu o pontificado, na Evangelii Gaudium: “Quero uma igreja em saída missionária”. Esse desejo já era expresso pelo papa Francisco anteriormente, no documento de Aparecida. Seus passos, nesses cinco anos, foram provocando a atitude de “conversão pastoral” na direção esperada. Agora é a ocasião: um mês missionário no mundo inteiro, e quem sabe mais para frente um ano missionário e por fim uma igreja permanentemente missionária. Francisco quis que tivéssemos um novo olhar: não voltado para nós mesmos, nossas comunidades, nossos movimentos e grupos, mas voltado para fora, para o mundo, para o futuro, para a humanidade. E esse novo olhar deve ter a marca da misericórdia. Lembram, o Ano da Misericórdia? Lembram a “Laudato Si” e o cuidado da natureza e dos pobres? Lembram a insistência na Família, e o dever de acolher a todos, sem exclusão? Lembram o Sínodo dos jovens, e agora o Sínodo especial da Amazônia?
São passos consequentes. Ele faz ressoar em nossos ouvidos aquele primeiro convite de Jesus aos discípulos: “Ide por todo mundo e pregai o Evangelho.” Portanto, não é uma invenção do Papa atual. É a voz de Cristo, que colocou em nosso batismo a urgência da missão.
Batizados e enviados
O tema escolhido pelo papa para este Mês Missionário Extraordinário, nos faz refletir sobre o sacramento do Batismo. Quem sabe ainda haja muitos cristãos que entendam o batismo como uma festinha familiar. Nem se recordam que no batismo já está presente a obrigação de ser missionários. Todos somos convocados a rever a nossa situação de batizados e perguntar cada um para si mesmo se está sintonizado com a missão. A mesma pergunta cada comunidade deverá fazer: quanto tempo o meu movimento gasta consigo mesmo, e quanto sobra para a missão? Quanta energia usamos para manter as nossas estruturas, e quanta energia sobra para a saída missionária? Quanto de nossos recursos (dízimos, coletas, campanhas…) são reinvestidos na manutenção da própria Igreja, ou movimento, e quanto sobra para aplicar na saída missionária? Penso que se fizermos essas perguntas com seriedade, vamos nos surpreender: precisamos dar passos decididos para ser Igreja verdadeiramente em saída.
Temos que dar passos, mas não para qualquer lado, como um barquinho que anda ao sabor do vento. Precisamos investir na formação missionária. Conhecer o querigma, que é a essência da pregação missionária. Temos que aprender e praticar a Leitura Orante da Palavra de Deus. Devemos também organizar itinerários de Iniciação à Vida Cristã. Conhecer a realidade dos campos de missão como a Amazônia, a África, as periferias existenciais. Saber como a missão foi realizada em outros momentos decisivos da história da Igreja e quais as urgências de hoje. Estamos em tempo de Planejamento diocesano e paroquial, que tal abraçar a ideia das “pequenas comunidades missionárias” de que falam as atuais diretrizes? São temas que demandam intensa formação. O Mês Missionário Extraordinário deve abrir nossas mentes nessa direção.
Propostas para o mês de outubro
O material preparado pela Comissão Missionária Diocesana, o COMIDI, será distribuído com uma proposta geral do MME, em sintonia com a Igreja do mundo inteiro. Mas conterá também algumas propostas básicas para viver o MME em nossa diocese. Chamo a atenção para a abertura diocesana do Mês Missionário que acontecerá na Catedral, no dia 1º de outubro, às 15h. É um horário difícil num dia de trabalho, mas penso que os padres e alguns representantes de cada paróquia deverão estar presentes. No mesmo dia, 1º de outubro, à noite, cada paróquia fará a abertura paroquial do Mês Missionário, garantindo a distribuição do 10material e programando as atividades paroquiais para este mês. Penso que todos podem utilizar a novena missionária programada pelo MME, mesmo aquelas paróquias que têm novena dos padroeiros. Lembrem da experiência missionária que fizemos na Visita Pastoral, que todas as Regiões se comprometeram em repetir. Formem ou incentivem ainda mais os Conselhos Missionários Paroquiais, os COMIPAS, a Infância e Adolescência Missionária (IAM) para que proponham e acompanhem ações missionárias em seu âmbito. Rezem a Oração própria do MME e divulguem a Mensagem do Papa Francisco para o Dia Mundial das Missões. Incentivem a Coleta do Dia Mundial das Missões, está destinada às Obras Missionárias de toda a Igreja, especialmente nos países de pouca presença cristã. Só não podemos aceitar o pecado da omissão, ou desperdiçar a chance que o Senhor nos dá para esses passos decisivos. É esse o “fogo” que Jesus disse ter trazido à terra, e queria que “já estivesse alastrado”.
Dom João Bosco, ofm
Bispo Diocesano de Osasco