Caros irmãos e irmãs, a paz!
Hoje, neste espaço que nos é concedido, refletiremos um pouco sobre um tema que pode soar aos nossos ouvidos, ou para a grande maioria das pessoas do mundo atual como algo ruim, negativo, deplorável e até amaldiçoado; falaremos da Pobreza.
Em primeiro lugar é necessário dizer que o conceito de pobreza pode ser analisado em diferentes aspectos: econômico, social, material, espiritual, cultural, etc; ainda assim, parece estranho falar de algo que a maioria das pessoas evita e até combate, talvez porque só tenham tido contato com a pobreza em sentido negativo. Tentaremos, brevemente, mostrar que existe uma “Pobreza” boa e que, inclusive, deve ser buscada por nós como fonte de bens duradouros, com enormes benefícios para nossa vida humana e espiritual. Ela não é nem sinônimo de miséria, nem é a ataraxia dos filósofos.
Comecemos por acentuar e distinguir duas das formas de pobreza: a material e a espiritual. Dentro de cada uma delas, uma boa e uma ruim. Pedagogicamente temos: uma pobreza material negativa, que desumaniza e é combatida: a pobreza como condição social padecida; uma pobreza material positiva, que liberta e eleva: a pobreza como ideal evangélico a ser cultivado; uma pobreza espiritual negativa, que é a ausência dos bens do espírito e dos verdadeiros valores humanos; uma pobreza espiritual positiva, feita de humildade e confiança em Deus, que é o mais belo fruto na árvore da pobreza bíblica.
Feita estas distinções, é importantíssimo frisarmos que a pobreza material, ou seja, o desapego, e também a espiritual, não é destinada só aos religiosos, padres e freiras, só a ricos ou pobres, mas a todos os homens e mulheres batizados. Você é batizado? Então você é chamado a viver a pobreza como virtude evangélica. Todos podem e devem vivê-la já que ela é um “conselho” vivido e ensinado por Cristo. O Pai, na pessoa de Jesus nos indica a indispensabilidade da pobreza: “Pois conheceis a graça de Nosso Senhor Jesus Cristo, que, sendo rico, tornou-se pobre por vossa causa, para que fosseis enriquecidos por sua pobreza (II Cor, 2, 9).
A Sagrada Escritura está repleta de citações referentes a este tema. Geralmente e quase que necessariamente a pobreza material que é ser livre em relação a posses, bens materiais que ultrapassam minhas reais necessidade e da minha família, exige a pobreza espiritual, que é fazer tudo com esmero e responsabilidade, porém, tendo sempre a humildade de reconhecer que vem de Deus tudo o que tenho e sou. Essas duas formas de pobreza são a face de uma mesma moeda.
Jesus diz: “Felizes os pobres em espírito, porque deles é o Reino do Céu” (Mt 5, 3); em outra passagem bíblica encontra um homem chamado Zaqueu, que era chefe dos publicanos e rico e se oferece para ir à sua casa; Zaquel lhe dirá: “Senhor: vou dar a metade dos meus bens aos pobres, e se em alguma coisa defraudei a alguém, lho restituirei quadruplicado” (Lc 19, 2 e 8). Também os Santos nos iluminam com seus ensinamentos: Santo Agostinho: “Tens ao teu lado aquele rico; talvez tenha dinheiro, mas não avareza, enquanto tu não tens dinheiro e és avaro” (Santo Agostinho- comentário ao Salmo 51, 14). São Francisco de Assis, que descobriu na “Altíssima Pobreza” o próprio modo de Deus ser, ao mesmo tempo orientava seus irmãos: “Advirto, porém, aos frades e os exorto a não desprezar e não julgar os homens que vestem roupas finas e vistosas e servem-se de alimentos e bebidas delicadas, mas cada qual de preferência julgue e despreze a si mesmo.” São Francisco foi pobre e reformou a Igreja de sua época através da pobreza, no entanto, como Yves Congar nos sugere, não pela via da crítica, mas da santidade, não exigindo dos outros, mas começando por si mesmo. Santa Clara de Assis passou toda a sua vida pedindo a aprovação de viver junto com suas irmãs o “privilégio” da Pobreza.
No entanto, temos Santos que foram veementes ao falarem contra o oposto da pobreza que é a riqueza como acumulação de bens apenas em benefício próprio. Vejamos São Jerônimo que denuncia: “As riquezas são injustas porque são fruto da miséria dos outros”. São João Crisóstomo ainda: “Tu vais participar da eucaristia? Então, não humilhes teu irmão. Não desprezes o faminto… Quê? Tu fazes memória de Cristo e desprezas o pobre? Tu não ficas horrorizado? Bebeste o Sangue do Senhor e não reconheces teu irmão? Ainda que o tenhas desconhecido antes, deves reconhecê-lo nesta mesa… Tu, que recebeste o pão da vida, não faças obra de morte” (São João Crisóstomo, 344-407; Comentário a 1Coríntios 11,17-34).Não há Santo que não tenha de alguma forma experimentado a pobreza tanto material quanto espiritual.
Para nós, fica a reflexão: provavelmente, seja por tudo isso que o Senhor diz: “Felizes, vós, os pobres, vosso é o Reino de Deus.” Que pobres são estes? Como tenho vivido esse “conselho”evangélico em minha vida? Sou indiferente com Deus e as pessoas?
Ir. Ana Paula, FPSS (Toca de Assis)